ACORDO ORTOGRÁFICO

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quarta-feira, 23 de maio de 2012

LÁGRIMAS DE CROCODILO


A desgraça é bem mais fecunda do que a felicidade e, sobretudo, quando se trata da desgraça dos outros, consegue-se ser poeticamente dramático, dizer as coisas com aquele ar de comiseração que faz parecer que até nos dói a nós. Foi o que me ocorreu quando, ontem num daqueles frente-a-frente periódicos e personalizados que as tv’s promovem, vi alguém referir, com lábios trementes e máscara de dor, o cruel desemprego que esta política de austeridade gerou, para o seu “minuto” livre.
Já desespero de alguma vez ouvir alguém escolher um louvor à alegria, à felicidade, ao trabalho produtivo ou à esperança, quando se trata de chamar a atenção, para despertar a simpatia que, um dia, pode render votos.
Porque estou certo de que a austeridade me afeta mais a mim do que a estes ilustres que por aí vão opinando e carpindo lágrimas de dores que não sentem, o que o desemprego de pessoas que me são muito chegadas e queridas ainda mais agrava, sentir-me-ia à vontade para dizer o que, por respeito a quem me lê, não digo aqui.
Ora favas, será a partir da austeridade que todo o mal acontece e o desemprego se instalou, ou a verdadeira causa de tanta dor é do que nos obrigou a ser austeros? E porque serão sempre os que mais culpas têm na coisa que mais areia tentam deitar-nos para os olhos e brincam com a dita (coisa ou coiso, tanto dá), em discursos maçadoramente repetitivos e agressivos da inteligência dos até menos dotados?
É por isto que não acredito na solidariedade a que apelam nem espero que, alguma vez, os políticos coloquem os interesses do povo que lhes deu o poder acima dos seus interesses pessoais. Para quem, como eu, já teve a oportunidade de, muitas vezes, escutar as conversas de bastidores, o cinismo já chateia demais e as lágrimas de crocodilo já não enganam.
Deitam-se os foguetes, corre-se atrás das canas, faz-se a festa toda, mas ninguém parece ouvir os estoiros que provocam. Se o fogo for de artifício… ainda se ergue a cabeça e se abre a boca de espanto para fazer ahhhhhh! Quem sabe se, por isso, a estes foguetes, em tempos se chamava “de lágrimas”!

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