A desgraça é bem mais fecunda do
que a felicidade e, sobretudo, quando se trata da desgraça dos outros,
consegue-se ser poeticamente dramático, dizer as coisas com aquele ar de
comiseração que faz parecer que até nos dói a nós. Foi o que me ocorreu quando,
ontem num daqueles frente-a-frente periódicos e personalizados que as tv’s
promovem, vi alguém referir, com lábios trementes e máscara de dor, o cruel desemprego que esta política de austeridade gerou, para o seu “minuto”
livre.
Já desespero de alguma vez ouvir
alguém escolher um louvor à alegria, à felicidade, ao trabalho produtivo ou à
esperança, quando se trata de chamar a atenção, para despertar a simpatia
que, um dia, pode render votos.
Porque estou certo de que a
austeridade me afeta mais a mim do que a estes ilustres que por aí vão opinando
e carpindo lágrimas de dores que não sentem, o que o desemprego de pessoas que
me são muito chegadas e queridas ainda mais agrava, sentir-me-ia à vontade para
dizer o que, por respeito a quem me lê, não digo aqui.
Ora favas, será a partir da
austeridade que todo o mal acontece e o desemprego se instalou, ou a verdadeira
causa de tanta dor é do que nos obrigou a ser austeros? E porque serão sempre os
que mais culpas têm na coisa que mais areia tentam deitar-nos para os olhos e brincam
com a dita (coisa ou coiso, tanto dá), em discursos maçadoramente repetitivos e
agressivos da inteligência dos até menos dotados?
É por isto que não acredito na
solidariedade a que apelam nem espero que, alguma vez, os políticos coloquem os
interesses do povo que lhes deu o poder acima dos seus interesses pessoais.
Para quem, como eu, já teve a oportunidade de, muitas vezes, escutar as
conversas de bastidores, o cinismo já chateia demais e as lágrimas de crocodilo
já não enganam.
Deitam-se os foguetes, corre-se
atrás das canas, faz-se a festa toda, mas ninguém parece ouvir os estoiros que
provocam. Se o fogo for de artifício… ainda se ergue a cabeça e se abre a boca de
espanto para fazer ahhhhhh! Quem sabe se, por isso, a estes foguetes, em tempos
se chamava “de lágrimas”!
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