(aguarela de Manuel Lima, 1974)
Achei interessante o discurso de Miguel Cadilhe no Clube dos Pensadores, sobretudo quando diz que a Democracia não está bem e que as eleições que aí vêm “nada vão tratar ou resolver”.
Achei interessante o discurso de Miguel Cadilhe no Clube dos Pensadores, sobretudo quando diz que a Democracia não está bem e que as eleições que aí vêm “nada vão tratar ou resolver”.
Infelizmente,
concordo com ele. E nem podia deixar de ser assim porque a democracia em Portugal,
a que eu vi despontar no 25 de Abril, não é a expressão do apuramento natural de
um modo de viver em sociedade, porque é, somente, o resultado inopinado de uma
revolução, de procedimentos bruscos que reflectem a ânsia de libertação de
regras que um regime de opressão sempre desperta, do desejo de desforra de
represália e de retaliação a que o sentimento de exploração não pode deixar de
incitar, do voluntarismo que crê poder atingir, de imediato, o que apenas por um
longo processo de aculturação pode ser alcançado.
Porque
não é num clima revolucionário que se criam condições para uma evolução maturadora
dos procedimentos e das atitudes de que o verdadeiro desenvolvimento social
carece, ao fim de quarenta anos perduram, ainda, os ressentimentos e os traumas
geradores de conflitos que mantêm abertas todas as “feridas” e fazem actuais
todas as “queixas” que foram a causa do descontentamento que apoiou a "revolução!
É,
pois, uma democracia mal resolvida a que não conseguiu, ao fim de tanto tempo,
resolver questões sociais básicas, que não encontrou soluções para os problemas essenciais que nos incomodavam e, em vez disso, gerou “castas” que se digladiam
na guerra constante da conquista do poder, sem ideais ou propósitos que
justifiquem muito mais.
Que
“o momento é grave e muito delicado”, tal como Cadilhe eu não tenho dúvidas mas,
em vez dele, não me surpreende “o quase zero de autêntico reformismo do Estado
nestes quatro anos que passaram”.
Cadilhe
encurtou demasiado o tempo para fazer as reformas necessárias para que se implante uma democracia e se crie o espírito de desenvolvimento de um país, talvez por se esquecer
das que não foram feitas ao longo dos anos que antes passaram, durante os quais, em vez disso, se cometeram desmandos, aconteceram oportunismos e se criaram vícios, no que, ele
próprio, tem as suas responsabilidades como governante que foi.
Não
é bom quando se vai com sede demais ao pote como foi o cantar da liberdade que
se não construiu ainda e o usufruir dos direitos que apenas com trabalho e
respeito pelos deveres que lhe correspondem se poderiam garantir.
Vi
crescer esta democracia que foi ficando refém de espertalhões e de
oportunistas, a quem esta confusão convém.
Não
será, por isso, que a democracia "escolhe pessoas que não prestam", como
disse Cadilhe, porque a “democracia” são elas mesmas e, por isso também, não “distingue
a tempo e não segrega os políticos de pouca diligência, débil carácter, o puro
sacana, o velhaco”, porque são esses que a dominam.
Enfim,
partilho com Cadilhe as preocupações que diz ter, mas distinguem-me dele as razões por que as tenho. Por
isso, só podemos estar em desacordo quanto ao modo de construir o futuro.
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