(Texto publicado no Notícias de Manteigas de Outubro 2011)
Depois de falar de solidariedade, uma virtude indispensável ao equilíbrio social que o atual modo de viver cada vez menos consente, era minha intenção falar este mês de ambiente, outra questão muito importante que já condiciona e acabará pondo fim ao crescimento económico suportado pelo consumismo excessivo.
Às agressões ambientais que esta economia selvagem que se diz civilizada provoca, responderá a Natureza de forma demolidora, com fenómenos e alterações que os nossos filhos e netos terão de suportar mais do que nós que somos a causa desses males. É o egoísmo na sua expressão mais refinada e que, tal como a inveja, o humaníssimo pecado que nos faz desejar não ter menos do que os outros, nos faz correr de um modo incauto para o abismo fundo que nos engolirá.
Ficará, quem sabe, para o próximo mês porque me parece mais oportuno falar hoje da necessidade absoluta da tomada de consciência da situação que vivemos se não quisermos cair na situação deplorável de outros que, sem consciência do mal que a si próprios causam, se revoltam contra o que os seus erros tornaram inevitável. Depois espero, se o puder fazer, falar de recursos naturais, aqueles que a Natureza nos permite utilizar de um modo equilibrado mas em cuja exploração nos excedemos, completando um conjunto de questões que, tenho por certo, estão entre as mais importantes das que vão moldar o futuro próximo da Humanidade e orientar a procura de formas mais naturais e seguras para uma vida menos materialista mas mais feliz.
Evitarei envolver-me em temas mais transcendentes de que outros bem melhor do que eu podem e devem falar, mas não consigo calar que espero há tempo demais por uma “Boa Nova” atual, com as palavras certas para o melhor entendimento dos problemas que, sendo de sempre, assumem formas próprias dos tempos e, por isso, exigem soluções a condizer com elas. Nesta espera pergunto-me, por vezes, que “cartas” escreveria hoje S Paulo aos falhados da História que fizeram vista grossa à realidade e não respeitaram a dignidade humana. Talvez nelas dissesse que a intolerância, o egoísmo e a inveja que “governam” este mundo são a súmula de todos os pecados que nos afastam de uma vida melhor. Sei lá!
Porém, se sinto o dever de contribuir, na medida em que posso faze-lo, para a formação de uma consciência coletiva esclarecida sobre as questões mais importantes para um futuro global, juntando a minha voz à de tantos que a erguem também e à de muitos que já a perderam no esforço inglório de alertar para perigos que apenas a ganância leva a ignorar, também me quero contar no número dos que, perante o que se passa, participam no esforço para esclarecer e desmistificar questões e ultrapassar os problemas que Portugal enfrenta.
Há muito que me deixei de partidarismos sem sentido, que me excluí dos manipuladores ou manipulados para me poder entregar ao “luxo” de ter ideias próprias, de poder ajustar o que penso quantas vezes entender dever faze-lo, de me não rever em estereótipos que ao longo do tempo perderam o sentido, de poder caminhar por e para onde quiser sem ter de seguir as pisadas de qualquer grupo a que pertença.
Apesar disso e pelas circunstâncias, creio chegada a hora de remarmos todos para o mesmo lado, num esforço conjunto para vencer, abdicando, de boa mente, de alguma liberdade de escolha, de alguns direitos que a situação de penúria não permite garantir e, também, de algumas comodidades para que seja menos longo este tempo de dolorosos sacrifícios que disparates demais nos obrigam a viver.
Não me parece que seja o que fazem dirigentes de sindicatos e partidos quando colocam interesses corporativos, partidários e projetos pessoais acima do interesse global para fazer de Portugal um país melhor e evitar os problemas que ainda possam complicar mais a vida de todos nós. Pelo contrário, parecem-me apostados em aproveitar as dificuldades que todos devíamos ajudar a resolver, para conseguirem uma promoção mais fácil e aumentar os ganhos políticos que, para além dos incondicionais apoiantes, outros incautos lhes possam proporcionar.
Esquecem-se os aspirantes ao poder e os reivindicadores oficiais dos muitos mais do que eles que não têm voz, dos que não têm quem por eles fale porque não pagam quotas para sindicatos, nem têm, senão a caridade, quem os defenda da miséria em que se caíram.
Não me parece ser esta a altura certa para promoções pessoais, para instigar tumultos e provocar o caos, sobretudo do modo capcioso e arrogante como o fazem, que dá má imagem de Portugal e prejudica o esforço para recuperar o bem-estar de todos nós.
Parecem-me ridículos os que, depois das burradas que fizeram, criticam quem ainda mal teve tempo de se aperceber de todas elas para, depois, as tentar corrigir. A seu tempo e pelo que fizerem serão avaliados.
Apesar de tudo, não seria adequado, seja o objetivo qual for, fazer um parêntesis na democracia nem abdicar dos direitos que a Constituição consagra, ainda que seja necessário adequá-los às circunstâncias dos tempos atuais numa revisão que afaste os preconceitos que ainda contém. Porém, reconhecer os limites das nossas possibilidades e não exigir mais do que as disponibilidades permitem, é a atitude certa e mais urgente quando o país está financeiramente exausto e em difíceis condições de financiamento.
Tem lugar destacado entre os pensamentos que me têm norteado, este que, porventura, alguma vez aqui já aqui terei citado: “se estamos com problemas, temos de pensar mais” porque pensar é uma ação pessoal e íntima, qual crivo pelo qual se faz passar tudo de que se tenha a perceção, mesmo o que pareça óbvio, a fim de o validar e tornar base para encontrar as respostas e as soluções necessárias. É uma atitude bem diferente da de aceitar as ideias que nos impingem como verdade e desejam ver aclamadas por multidões incapazes de as avaliar; é uma atitude indispensável de confirmação porque a verdade definitiva não existe neste mundo.
É pelo pensamento que o Homem se liberta e, livre, adquire consciência da realidade, faz as suas escolhas e decide como proceder. De outro modo não passará de alguém que aceita o que outros escolham para si.
Por isso devemos pensar!
A propósito, vem-me à lembrança algo que há muito me não acontece. Era frequente, quando conduzia por estradas de pouco tráfego, aparecer um cão correndo e ladrando furiosamente ao lado do carro, até se cansar. Um dia resolvei parar. O bicho parou também e, já mudo, olhou-me como que a perguntar “agora o que é que faço?”. Lançara-se numa aventura sem causa, sem consciência do que fazia!
Rui de Carvalho
26 setembro 2011
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