ACORDO ORTOGRÁFICO

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sábado, 16 de junho de 2012

PREOCUPAÇÕES ACRESCIDAS VINTE ANOS DEPOIS


(publicado no Notícias de Manteigas de Junho 2012)
Quando, em 1992, aconteceu, no Rio de Janeiro, uma “cimeira” que, pela sua importância, ficou conhecida por Cimeira da Terra, a preocupação era a sustentabilidade do “desenvolvimento” e, por isso, tinha como objectivo compatibilizá-lo com a conservação e a protecção dos ecossistemas do nosso planeta, nos quais os danos causados pelo crescimento económico eram já motivo de grande apreensão. De facto, para alguns mais informados e atentos, a redução da biodiversidade, o avanço da desertificação e as mudanças climáticas constituíam problemas a reclamar muita atenção e, até, a tomada de medidas profundas e imediatas.
Segundo a filosofia de então, o “desenvolvimento sustentável” seria alcançado refreando o “consumo”, de modo a evitar o excesso de resíduos, reduzir a poluição e a contaminação do meio natural, controlar a produção de gases com efeito de estufa e destruidores da camada do ozono, entre outras atitudes consideradas indispensáveis e urgentes. Todas elas, medidas baseadas em conceitos quantitativos.
A Carta da Terra foi o documento final no qual se afirma que “a paz, o desenvolvimento e a protecção do meio ambiente são interdependentes e inseparáveis”, do que deve deduzir-se que foi reconhecido que à política económica não devem ser indiferentes os efeitos ambientais que produza.
Foi assinado um acordo, a Convenção da Biodiversidade que, para além de efeitos protectores, teve em vista uma divisão equitativa dos benefícios dos recursos genéticos da Terra. Igualmente, foi produzido um Tratado sobre Mudanças Climáticas que o Protocolo de Kyoto, mais tarde, regulamentou mas nem todos assinaram. Os maiores poluidores, como os Estados Unidos, ficaram de fora e o Canadá, país que o “aquecimento global” temporariamente beneficiará, resolveu desvincular-se dele recentemente, como o declarou o seu Primeiro Ministro.
Cinco anos depois, também no Rio de Janeiro, foi realizada uma conferência da qual resultou um documento com diversas decisões, cujo espírito de “solidariedade” se manifesta numa introdução vinculatória na qual se afirma “De forma solidária entre todos e com a comunidade da Vida, nós, os povos do mundo, comprometemo-nos à acção orientada pelos seguintes princípios inter-relacionados…”.
Diversos encontros, protocolos e acordos se seguiram, mas não conseguiram evitar que, vinte anos depois, o Fundo Mundial da Natureza (WWF) afirme que “vivemos como se tivéssemos um planeta extra à nossa disposição” porque a biodiversidade se reduziu de quase um terço nas últimas décadas, em consequência do aumento do consumo, do correspondente acréscimo da exploração dos recursos naturais e, obviamente, da degradação ambiental que produz.
A propósito do relatório “Planeta Vivo 2012”, há muito pouco tempo publicado, Jim Leape, director-geral da WWF afirma que “utilizamos 50% mais recursos do que aqueles que a Terra pode produzir de forma sustentável…”, o que é muito grave quando as “necessidades” aumentam com a população mundial da qual apenas um terço consome a maior parte, cerca de metade sofre privações sérias e centenas de milhões sofrem e morrem de fome! Jonathan Baillie, da Sociedade Zoológica de Londres, afirma que “ignorar este relatório trará graves consequências para a Humanidade” pois, sendo a biodiversidade um indicador iniludível da “saúde” do Planeta, poderemos concluir que a situação não melhorou nos últimos vinte anos, apesar do reconhecimento oficial da urgente necessidade de impedir a sua continuada degradação.
Os líderes políticos mundiais voltam agora a dispor de uma oportunidade na “cimeira “Rio+20”, na qual poderão decidir enfrentar os gravíssimos problemas apontados no relatório “Planeta Vivo 2012” ou, numa atitude de egoísmo suicida, ignorá-los e continuar a iludir as soluções que a situação cada vez mais reclama, tal como até aqui têm feito.
Nesta nova Cimeira do Rio que deverá estar a decorrer quando este texto for publicado, especialistas têm a intenção de substituir o PIB que actualmente mede o crescimento económico dos países, por uma unidade de bem-estar que integre a protecção do Ambiente e dos Recursos Naturais e, deste modo, seja um indicador do “desenvolvimento sustentado” que, mais uma vez, é a preocupação declarada. Será um conceito próximo do de “qualidade de vida” de que o “nível de vida”, traduzido no PIB que conflitua com outros factores que se integram nas “condições de ambiente” e nas “condições de vida”, nunca poderá ser a variável independente ou o fator determinante. Por isso há um equilíbrio que se impõe encontrar com renúncias a fazer e valores a recuperar.
Porém, soa a estranha esta preocupação num mundo enredado numa crise para a qual apenas o “crescimento económico” é, generalizadamente, apontado e discutido como única solução, o que, naturalmente, faz temer que, de novo, os responsáveis se fiquem pelos propósitos que, em outras ocasiões, já definiram mas nunca praticaram.
O conceito de qualidade de vida é-me particularmente grato, quem sabe pelas minhas origens numa Terra que dela faz uma bandeira, com água, ar e solo que possuem uma qualidade já difícil de encontrar por esse mundo fora e por isso deve pautar os seus propósitos de desenvolvimento, tal como deverá ser a sua garantia de um futuro melhor! É um bem cujo valor crescerá pela raridade e é uma oportunidade num mundo que, forçosamente, terá de mudar.
Lembro-me de já aqui ter abordado estas questões por diversas vezes. Mas não acho excessivo aproveitar esta oportunidade que a iniciativa Rio+20 me dá para, de novo, chamar a atenção para problemas que cada vez sentimos mais como, por exemplo, este clima que se tornou demasiado irregular e no qual já dificilmente distinguimos as famosas Quatro Estações. Entretanto, divertir-me-ia muito com os disparates que oiço aos “especialistas” se não fossem os nossos filhos e os nossos netos as vítimas das baboseiras que dizem e dos erros que insistem em cometer.
Uma coisa me parece certa, a de que não teremos oportunidade para uma cimeira Rio+40 se, desta vez, não resolvermos inflectir, rapidamente, as nossas atitudes.
Rui de carvalho, 20 Maio 2012

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