Num mundo que, necessariamente, tem de sofrer uma mudança
global drástica, feita de muitas mudanças em muitos domínios, é indispensável
reflectir sobre os problemas que teremos de enfrentar num futuro não muito
distante, para encontrar formas adequadas para os resolver.
Um dos aspectos mais prementes, a par da exaustão de
recursos e da degradação ambiental com todas as suas consequências, é o modo
como, perante a inevitabilidade da falta de empregos para toda a gente,
garantir a todos os meios financeiros que a falta de emprego lhes não garante.
Tão importante me parece que me permito transcrever, a
seguir, um texto que Natália Faria publicou no Público:
O trabalho deixou de constituir
uma protecção contra a pobreza, tendo-se transformado num mecanismo de
aprofundamento das desigualdades sociais
A prova disto, sustenta o sociólogo Agostinho Rodrigues
Silvestre, é que 12% dos trabalhadores portugueses viviam abaixo do limiar de
pobreza em 2010.
Que o número de trabalhadores pobres tem vindo a aumentar mostra-o também o facto de 16% das pessoas que em 2011 usufruíram do Rendimento Social de Inserção (35.015) terem acumulado aquele subsídio com rendimentos do trabalho. Numa altura de precariedade generalizada, estes indicadores denotam que o trabalho está a deixar de ser veículo de emancipação e, mais do que isso, "a necessidade de as sociedades se reorganizarem para deixarem de ter no trabalho a primordial fonte de rendimento dos cidadãos", defende Agostinho Rodrigues Silvestre, na comunicação que vai apresentar durante o VII Congresso Português de Sociologia, de quarta a sexta-feira próximas no Porto.
Com um painel sobre crise e perspectivas políticas que juntará o ex-Presidente da República Mário Soares e o ex-líder da CGTP Carvalho da Silva, o congresso vai juntar centenas de sociólogos, contando com uma sessão temática dedicada à economia, trabalho e precariedade. Nela, Agostinho Silvestre basear-se-á nos indicadores portugueses para sustentar que, pesem embora os esforços para preservar a ética do trabalho e as tentativas de encontrar novas jazidas de emprego, nomeadamente no sector social, as sociedades não mais voltarão a ser de pleno emprego.
"O desemprego em Portugal cresceu de uma forma consistente entre 2000 e 2010, ou seja, numa década passou de 4% para 11% e o que a crise veio fazer foi apenas agudizar essa tendência", observa. "O que isto nos mostra é que o modo como as sociedades se organizaram a partir da revolução industrial, mas sobretudo a partir da II Guerra Mundial - em que o trabalho se consolidou como princípio organizador da vida individual e colectiva e foi proclamado como referência identitária e medida das permutas sociais - vai ter que sofrer uma profunda transformação".
Dito doutro modo, a subsistência dos indivíduos terá que ser desligada do trabalho. "O próprio sistema de protecção social está muito ligado à posição que o indivíduo ocupa no sistema produtivo e a ideia que tem vindo a ganhar consistência, nalguns movimentos intelectuais e nalgumas linhas de investigação, é que esta lógica terá que ser substituída por aquilo a que se tem chamado rendimento médio de cidadania, a atribuir a cada cidadão independentemente da posição que este ocupa no sistema produtivo".
De onde viria o dinheiro? "Por via de uma reformulação total do sistema de Segurança Social, isto é, pela canalização dos recursos afectos a abonos de família, reformas, etecetera, para esse rendimento médio. É uma ideia polémica, mas há cálculos que demonstram que 80% do que se gasta hoje com essa proliferação de apoios chegariam para pagar a todos os cidadãos com mais de 18 anos esse rendimento médio, cujo valor teria que ser discutido, não ao nível de Portugal ou Espanha, mas de toda a Europa e até do mundo ocidental", admite o sociólogo.
Considera que, independentemente do que vier a seguir, o que o Estado não pode, numa altura em que a precariedade laboral se generalizou, é continuar a atirar o ónus do desemprego para as costas dos cidadãos: "O Estado põe no indivíduo a responsabilidade de procurar emprego, o que, numa altura em que o trabalho entrou em desordem mas continua a habitar a ordem social, pode significar forçar os cidadãos a procurar uma coisa que não existe".
Que o número de trabalhadores pobres tem vindo a aumentar mostra-o também o facto de 16% das pessoas que em 2011 usufruíram do Rendimento Social de Inserção (35.015) terem acumulado aquele subsídio com rendimentos do trabalho. Numa altura de precariedade generalizada, estes indicadores denotam que o trabalho está a deixar de ser veículo de emancipação e, mais do que isso, "a necessidade de as sociedades se reorganizarem para deixarem de ter no trabalho a primordial fonte de rendimento dos cidadãos", defende Agostinho Rodrigues Silvestre, na comunicação que vai apresentar durante o VII Congresso Português de Sociologia, de quarta a sexta-feira próximas no Porto.
Com um painel sobre crise e perspectivas políticas que juntará o ex-Presidente da República Mário Soares e o ex-líder da CGTP Carvalho da Silva, o congresso vai juntar centenas de sociólogos, contando com uma sessão temática dedicada à economia, trabalho e precariedade. Nela, Agostinho Silvestre basear-se-á nos indicadores portugueses para sustentar que, pesem embora os esforços para preservar a ética do trabalho e as tentativas de encontrar novas jazidas de emprego, nomeadamente no sector social, as sociedades não mais voltarão a ser de pleno emprego.
"O desemprego em Portugal cresceu de uma forma consistente entre 2000 e 2010, ou seja, numa década passou de 4% para 11% e o que a crise veio fazer foi apenas agudizar essa tendência", observa. "O que isto nos mostra é que o modo como as sociedades se organizaram a partir da revolução industrial, mas sobretudo a partir da II Guerra Mundial - em que o trabalho se consolidou como princípio organizador da vida individual e colectiva e foi proclamado como referência identitária e medida das permutas sociais - vai ter que sofrer uma profunda transformação".
Dito doutro modo, a subsistência dos indivíduos terá que ser desligada do trabalho. "O próprio sistema de protecção social está muito ligado à posição que o indivíduo ocupa no sistema produtivo e a ideia que tem vindo a ganhar consistência, nalguns movimentos intelectuais e nalgumas linhas de investigação, é que esta lógica terá que ser substituída por aquilo a que se tem chamado rendimento médio de cidadania, a atribuir a cada cidadão independentemente da posição que este ocupa no sistema produtivo".
De onde viria o dinheiro? "Por via de uma reformulação total do sistema de Segurança Social, isto é, pela canalização dos recursos afectos a abonos de família, reformas, etecetera, para esse rendimento médio. É uma ideia polémica, mas há cálculos que demonstram que 80% do que se gasta hoje com essa proliferação de apoios chegariam para pagar a todos os cidadãos com mais de 18 anos esse rendimento médio, cujo valor teria que ser discutido, não ao nível de Portugal ou Espanha, mas de toda a Europa e até do mundo ocidental", admite o sociólogo.
Considera que, independentemente do que vier a seguir, o que o Estado não pode, numa altura em que a precariedade laboral se generalizou, é continuar a atirar o ónus do desemprego para as costas dos cidadãos: "O Estado põe no indivíduo a responsabilidade de procurar emprego, o que, numa altura em que o trabalho entrou em desordem mas continua a habitar a ordem social, pode significar forçar os cidadãos a procurar uma coisa que não existe".
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