ACORDO ORTOGRÁFICO

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domingo, 22 de junho de 2014

OS LIMITES DA CONSTITUIÇÃO

Parece-me a mim, cidadão comum que sou, que à lógica própria da inteligência que nos permite fazer juízos das coisas, não deveria ser contrária uma outra lógica, a dos especialistas do Direito que, pelas leis complexas de que necessitam para o ser, tomam, em nome do povo, decisões que este nem sempre entende muito bem ou nem sequer entende.
Sempre tive a noção de ser o Direito uma “ciência” que tanto mais se afasta da sua razão de ser quanto mais complexa as suas leis a fizerem pois, deste modo, para aqueles a quem se aplica se torna pouco clara ou, mesmo, obscura.
É o contrário daquela Ciência a que me habituei e no desenvolvimento da qual qualquer um pode participar desde que atento ao mundo à sua volta que se rege pelas leis da Natureza da qual somos parte e são, por isso, as leis imutáveis do mundo em que vivemos e que, por mais que o queiramos, não podemos alterar. É com muito esforço que as vamos descobrindo e com muita humildade que admitimos corrigi-las perante uma realidade que se nos não revela de uma vez só. É o nosso esforço de investigação que a vai revelando.
O Direito é outro mundo que a Natureza não domina, é a “ciência” convencional que cada “civilização” cria ao seu jeito na pretensão de julgar o que resulta de uma lei mais forte e que é igual para todas. Daí as enormes confusões que gera, os problemas que cria e as injustiças que pratica.
Não tem, por isso, a harmonia de um grande e sábio plano que se desenvolve imperturbável, mesmo quando os pigmeus que somos, no curtíssimo lapso de tempo em que por aqui andam, têm a pretensão de poder controlar.
Já me escandalizei com várias decisões jurídicas que me pareceram não fazer sentido e, sobretudo, não fazer justiça. Decisões que afectam este ou aquele que teve a pouca sorte de a elas ficar sujeito. Preocupam-me estes casos, naturalmente, porque posso ser eu, um dia, a vítima de uma Justiça que não consiga ser justa. Mas preocupa-me, agora, muito mais outra “justiça” que está na moda e começa a por a nu aspectos que deveriam levar-nos a questionar os limites do Direito.
Obviamente, estou a pensar no Tribunal Constitucional que me não parece que cumpra a missão que bem lhe assentaria de compatibilizar uma Constituição antiga com a realidade actual que os seus autores desconheciam. E se a Constituição que temos resultou do que dela decidiu fazer uma maioria quantitativa, já a realidade apenas muito pouco depende de nós porque a imparável viagem do tempo tudo altera e faz passar as eras em que esta, a desta Humanidade, não passa de um curto episódio. Com ela desaparecerão as suas leis e continuarão as da Natureza que, tantas vezes, desprezam.
Não faz sentido, penso eu, que nos deixemos enganar pela comodidade de pensar que sempre foi assim e assim será, porque nem sempre foi assim e assim deixará de ser com toda a certeza, talvez mais cedo do que pensamos se para isso insistirmos em contribuir.
Não me sinto confortável quando noto ter sido o artigo da Constituição que adiante transcrevo aquele que impediu a intenção do Governo de reparar as diferenças notórias de tratamento e de privilégios entre um sector com grande capacidade reivindicativa, o público, e outro onde apenas o sucesso do trabalho pode dar quaisquer garantias, o privado.
Artigo 13º da Constituição
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual."
Mais me parece este artigo justificar as intenções do Governo do que a decisão do TC porque as dificuldades do país deverão ser ultrapassadas com o esforço de todos e não mantendo os privilégios de alguns, princípio que o último acórdão do TC me não parece respeitar.
Aliás, são díspares as opiniões dos “constitucionalistas do costume” que, por diversas razões, não são igualmente merecedores da minha consideração. Porque alguns me parecem excessivamente defensores do obscurantismo com que alguns juristas se defendem do bom senso dos “pagãos” que não acreditam que, necessariamente, o Direito seja justiça.
À opinião de Vital Moreira que já incluí nas minhas reflexões e que, como beneficiário da decisão, se diz “grato” por ela mas dela discordante, junto agora esta de Paulo Mota Pinto, ex-juiz do TC, que diz assim:
As sucessivas decisões de inconstitucionalidade levantam problemas de governabilidade, sobretudo porque não são dadas directrizes ao legislador e porque não tomam em conta, como deviam na interpretação do parâmetro constitucional, as obrigações do Estado português sobre os limites orçamentais e regulamentos sobre a gestão financeira pública [de acordo com a legislação comunitária conhecida por SIX Pack]. Se há obrigações internacionais que impõe ao limite ao défice e à evolução da despesa, o Tribunal Constitucional, ou as toma em conta, ou diz que não o pode fazer por não serem conformes à constituição. O que não pode fazer é ignorá-las.”
Por isso é grave que tanta gente, em vez de pensar, acredite no que parece que lhe convém, sem querer ver uma realidade dura que, inevitavelmente, terá de enfrentar sem que a Constituição a possa defender.



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