Quarenta anos depois do 25
de Abril de 1974, comemorar a queda de um regime autoritário com ataques a um
Governo a que o regime democrático então restaurado deu a oportunidade de
governar, em vez de louvar a possibilidade de o poder fazer por decisão do povo,
não pode ser senão um oportunismo preconceituoso que, em tempo de campanha
eleitoral, se aproveita das emoções próprias de um evento de cujas
consequências, melhores ou piores, não deveríamos querer abdicar
Para minha desilusão, não
são para exaltar um acontecimento mas para atacar um governo que se fazem
conferências “abrilistas” com discursos inflamados que não tomam a restauração
da liberdade política como um propósito mas, em vez disso, como a oportunidade
de uma ideologia que outras não podem afrontar sem cometer heresia.
Proceder deste modo é, só
por si, um contra-senso, uma subversão dos conceitos mais básicos da
democracia. Mas fazê-lo de um modo manipulador de “verdades” e sem o bom senso
de quem deve fazer da autenticidade e do saber as artes com as quais se previne
o futuro de um país, é uma atitude condenável.
“Já não temos Serviço
Nacional de Saúde, já não temos Serviço Social…” e mais coisas, com pouco ou
nenhum sentido, disse Mário Soares que já não temos, afirmando que os
responsáveis por tal situação “deverão, por isso, um dia ser julgados.”
Esqueceu-se, sem dúvida,
dos efeitos das governações perdulárias que lhe causaram amargos de boca, o
levaram a estender a mão à boa vontade do FMI e fizeram dele o primeiro
governante do pós 25 de Abril, a pedir ao povo para “apertar o cinto”!
Eu penso que os
responsáveis pelo que estamos a passar foram já julgados, como ele o foi
também, em eleições que lhes retiraram o poder que não usaram como deveriam, o
que é a razão mais forte para a situação de austeridade financeira que vivemos,
estando, naturalmente, a sofrer as consequências dos desmandos cometidos, dos
abusos consentidos e das más decisões tomadas por quem, dizendo recusar o
“discurso da tanga”, comprometeu o futuro num salto para o abismo no qual, como
afirmou, se sentia “sozinho a puxar pelo país”.
E o discurso do
preconceito oportunista prossegue com outros protagonistas estranhos como o é,
sem dúvida, Freitas do Amaral, o primeiro presidente do partido mais à direita
do leque político português, que classificou este Governo como o mais à direita
que alguma vez governou Portugal e afirmou estarmos a viver um momento de
retrocesso histórico como jamais se viu! Saberá muito do passado o Professor
que, ao contrário do que um político deve saber, não parece fazer ideia do que
seja a realidade actual, das mudanças profundas que o mundo sofreu nem do que,
por elas, possa ser o futuro próximo que, um dia, será História também.
E, como se tornou moda,
até um bem conhecido militante do PSD, tal como outros desde há tempos mais entregue
mais à crítica do que à participação militante que poderia permitir, ao governo
do seu partido, ser melhor, mesmo sem cravo participou nesta ladainha de
maldizer.
Será que é, deste modo, que
Mário Soares pretende cumprir o propósito de um conhecido “capitão de Abril” para correr com
o Governo à paulada e Fretas do Amaral pretende reentrar na política onde perdeu o lugar, formando um novo partido?
Não é o Governo que me
preocupa, mas o modo como esta democracia é vivida, o modo como uma comemoração
é aproveitada de um modo impróprio e descabido, o que me faz preocupar com o
futuro a que os maus procedimentos possam conduzir.
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