Francamente, já me aborrece o
caso académico de Relvas, tal como aconteceu com o de Sócrates, dois entre
tantos de caça ao “canudo” que, depois, outro proveito poderá não ter para além
do uso de um “título” que, em boa verdade, não confere. Não se exige um título
de doutor para ser deputado ou membro do governo, porque são outras as vias que
aí conduzem. Mas, como os factos comprovam, ser deputado ou membro do governo
já pode, por sua vez, ser a via rápida para um título.
Mas não é nada disto o importante
neste mundo de doutores onde a ignorância se disfarça em retóricas confusamente
brilhantes ou se esconde atrás de um título que se exibe como um troféu. Talvez
nem tanto hoje em dia, desde que passou a haver centenas de cursos que, “em
três tempos”, fazem “bachareis” que, automaticamente, se dizem doutores. E os
que o não são também arranjam algum modo fácil de o ser, nem que seja no
“diploma” de uma associação qualquer a que pertençam, no qual, antes do nome,
se coloca um bem evidente Dr!
Depois do “Processo de
Bolonha” tudo é possível, mesmo as atitudes mais ridículas como concluir o
curso ao domingo ou num ano só, por exemplo, não se exigindo, sequer, que se
assista às aulas que a leitura de uns capítulos de uns quantos livros pode
substituir. Apetece perguntar para que servem as aulas e os professores se,
nem sequer, é obrigatório participar nelas para se ser doutor! E como não
conheço livro sobre matéria alguma que ensine a pensar, o que, em meu juízo, é indispensável para
o conhecimento seja do que for, poderei concluir que a um candidato a doutor
bastará decorar o que vem no livro e, depois, debitá-lo em exames que, deste
modo, testam a sua memória, não o seu saber.
“Bolonha”, melhor talvez a sua aplicação do modo que conhecemos, deverá ter sido a
decisão mais tacanha alguma vez tomada em relação ao ensino superior onde o
lidar com a vida deveria ser preparado com o trabalho e o cuidado que aprender
exige, sobretudo agora, neste mundo saturado que cada vez menos consente erros
grosseiros sem consequências danosas. Por isso, é necessária elevada
competência para tomar decisões cujos efeitos podem afetar todos nós. Com
“Bolonha” a preparação para assumir responsabilidades elevadas tornou-se
descuidada e os cursos para ser doutor uma corrida que não dá tempo para uma breve
reflexão e menos ainda para a síntese das diferentes matérias cujo conhecimento
pressupõe.
Se, antes, ser doutor era
pertencer a uma elite bem preparada, hoje, não o ser é a desqualificação
absoluta numa sociedade em que sê-lo está ao alcance de todos, não sendo o
saber nem a competência o que, tantas vezes, é reconhecido no diploma que lhe
corresponde.
Curiosamente, vou-me dando conta
de currículos onde há o cuidado de acrescentar, em relação à formação
académica, “curso pré-Bolonha”!
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