A austeridade a que o
resgate financeiro nos obriga, não é mais do que o rigor nas nossas decisões de
gastar perante a penúria de meios a que a gestão, feita no passado, nos fez
chegar.
Sem dinheiro bastante para
satisfazer os encargos assumidos, o país deixaria de pagar salários, pensões,
fornecimentos, tal como não poderia honrar os compromissos da dívida corrente
e, consequentemente, ficaria na situação vulgarmente conhecida por bancarrota.
Seria esta a situação do
país se o anterior governo não tivesse acabado por pedir um resgate financeiro
que a União Europeia, o Banco Central Europeu e o FMI lhe concederam a troco de
compromissos constantes de um acordo assinado, cujo cumprimento uma “Troika” de
representantes daquela entidades controla com muito rigor.
A realidade tem mostrado
as causas do descalabro a que as finanças do país chegaram em consequência de
gastos excessivos com pessoal e com a “estrutura” na Administração Pública, de
decisões financeiras erradas, de contratos ruinosos celebrados para construção
de infraestruturas e prestação de serviços, dos desequilíbrios atingidos na
Segurança Social e no Serviço Nacional de Saúde, bem como com a falta de
controlo que permitiu as promiscuidades que fez de muitos espertalhões milionários,
permitiu a corrupção que desviou enormes somas de dinheiros públicos e fez
florescer o “mercado paralelo” que se furta ao cumprimento das obrigações
fiscais e, por isso, sobrecarrega aqueles que delas não podem escapar.
O resultado de tudo isto,
para evitar a bancarrota, só poderia ser a austeridade que, necessariamente,
teria por efeito um abaixamento significativo do “nível de vida” a que
corresponde um efectivo “empobrecimento” e, naturalmente, um aumento da dívida
pública em consequência dos avultados empréstimos recebidos na operação de
resgate.
Toda esta lógica é natural
após a situação alcançada por uma governação que não foi prudente nos seus
gastos, não foi atenta nas acções de fiscalização da economia nacional e não
foi, sequer, competente nas decisões que tomou e em muitos contratos que
firmou.
Em suma, a situação
financeira atingiu contornos de verdadeiro caos causado por incompetências e
por actos ilícitos que deveriam ser cuidadosamente apurados, julgados e
condenados, mas cuja responsabilidade, como é infeliz hábito que aconteça,
acaba por ser atribuída a quem herda os problemas e tem de encontrar formas
para os resolver.
Aquilo de que nos
lembramos é de que vivíamos bem durante os governos de Sócrates e vivemos pior,
alguns muito mal até, no governo de Passos Coelho. Logo, as culpas serão deste
e não de quem causou os problemas! Esta é a lógica tola que dá lugar a reacções
destemperadas como a que, na Antiguidade, levou um general a matar o estafeta
que lhe trouxe a notícia da derrota numa batalha!
Nestas condições, é
natural que todas as armas apontem para quem acaba por ter de desmontar e
resolver os erros praticados por outrem, para quem deixou de permitir a euforia
financeira dos que gostavam de ser ricos e tem, ainda, pela frente, um longo
caminho de limpeza de maus hábitos que as nossas reais capacidades não podem
sustentar.
Não será travando uma
guerra entre os que seguem um caminho e os que, simplesmente, o contestam e confrontando as imposições do resgate concedido com os “direitos que conquistámos" que sairemos de uma situação delicada, muito complexa e mais difícil de
resolver porque todo o mundo está mergulhado na “crise” económica e financeira, a
maior de todos os tempos, da qual não consegue sair, o que reduz as
possibilidades de ajuda que, para ultrapassar a nossa, nos possa dar.
Aliás, por todo o mundo as
mesmas dificuldades se sentem, se instala a mesma incapacidade em manter os
ritmos económicos que nos iludiam quanto a uma riqueza que não tínhamos e todos
acabarão por se habituar ao “nível de vida” que os recursos naturais de que
dispomos nos podem proporcionar e a Natureza, o meio a que pertencemos e nos permite viver,
nos consente.
Por tudo isto a
“austeridade” não é, afinal, senão viver conforme os nossos recursos nos
consentem.
Amenizá-la resultará da
valorização desses mesmos recursos e da sua utilização comedida. Com muito esforço.
Certamente.
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