Começo por dizer que me
repugnam os procedimentos praxistas exagerados que, mesmo distantes dos que já
foram causa de dramáticas consequências, envolvem humilhações e outros abusos
que, digam o que disserem, jamais podem ser indispensáveis à integração dos
novos alunos nas comunidades académicas.
Obviamente, tive as minhas
experiências de integração, a primeira das quais foi aos 10 anos, quando, pela primeira
vez, me afastei dos meus pais e da minha casa para poder fazer o Liceu, na
Guarda, uma cidade com fortes tradições académicas, inspiradas nas de
Coimbra.
Os estudantes eram a
animação daquela cidade com os seus procedimentos atrevidos e irreverentes mas alegres que,
muito raramente, excederiam o que era socialmente aceitável, como me parece próprio
de quem atinge um certo nível educacional.
A praxe de integração,
para além das “reverências” a que os veteranos tinham direito e,
consequentemente, os caloiros tinham de lhes prestar, não era mais do que o ali
famoso “baptizado dos caloiros”.
Numa longa procissão de miúdos
envolvidos em lençóis, dirigíamo-nos à “dorna”, onde tinha lugar a cerimónia
que consistia em lançar água sobre o caloiro, mais ou menos intensamente
consoante a apreciação que dele tivesse sido feita ou da protecção que o “padrinho”,
um veterano, lhe pudesse dar. Em casos extremos, mas raros, poderia o caloiro,
recalcitrante ou mais participante, ter direito a um banho por inteiro, o que
não era muito agradável no tempo frio que, na altura, por lá fazia.
Toda a cidade apreciava
esta prática e o dia era de festa.
Uma ou outra rapadela de
cabelo, embora raramente, podia ser o castigo de um caloiro encontrado na rua
fora de horas!
Vim, depois, para Lisboa
onde, então, se não usavam trajes académicos e, com bastante pena, tive de
arrumar a minha “capa e batina” de que tanto gostava. Mas ainda conservo,
algures, a colher de pau que se usava naqueles dias especiais, engalanada com
as fitas que eram oferecidas por pessoas especiais também.
Em Lisboa, a integração fazia-se
nos famosos bailes de caloiros que sempre se realizavam, com alguma imponência,
em lugares amplos e bem conhecidos. Eram muito concorridos e neles aconteciam
encontros e se faziam amizades, algumas bem duradouras.
Lembro-me que foi num desses bailes que eu ouvi, pela primeira vez e na voz de Mário Fernando, a "canção do mar" que, muito tempo depois, Dulce Pontes fez renascer.
Lembro-me que foi num desses bailes que eu ouvi, pela primeira vez e na voz de Mário Fernando, a "canção do mar" que, muito tempo depois, Dulce Pontes fez renascer.
Depois, foi o final do
curso com o famosíssimo Baile de Finalistas que, no Instituto Superior Técnico,
assumia uma pompa que o tornava num acontecimento social relevante, porventura
o mais famoso de Lisboa.
AS praxes de integração
a que fui sujeito, nada tinham a ver com rituais secretos e abusivos e não
creio que, por isso, não fossem adequadas a uma integração total na nova
comunidade de que passava a ser membro.
Naturalmente, os
procedimentos alteram-se, sofrem mudanças que temos de aceitar. Mas que vão ao
ponto a que já chegam em alguns casos, que impliquem a possibilidade de ofensas
graves à dignidade e á integridade física das pessoas que, por vezes, têm lugar,
é que me parece não fazer qualquer sentido.
Não sei pormenores do que
se terá passado na Praia do Meco e que, estupidamente, ceifou a vida a seis
jovens. Mas tudo aquilo que já se conhece me faz pensar em coisas estranhas, em
procedimentos macabros que nenhuma praxe deve comportar.
A vida académica é um
período da vida muito especial, no qual me parece fazerem pouco sentido
práticas que não correspondam à alegria de viver.
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