ACORDO ORTOGRÁFICO

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terça-feira, 14 de janeiro de 2014

O SEGREDO DE JUSTIÇA E O JORNALISMO

Não é que me agrade meter a foice em seara alheia, mas os silogismos mal acabados não me convencem e, por isso, terei de os contestar. Aliás, penso que todos nós, os ignorantes mas não estúpidos, tempos direito a explicações cabais, daquelas que nos limpem as dúvidas de vez.
O segredo de justiça existe, está consagrado na lei. Logo, é para respeitar sob pena de se desrespeitar a lei, o que é um crime! Em consequência, quando este segredo protegido por lei e revelado, é cometido um crime que em democracia, o regime no qual os direitos de todos são iguais, deve ser punido.
Não discuto o segredo de justiça em si mesmo que, dizem os entendidos, serve para proteger a investigação e os direitos dos investigados, o que me parece bem.
Mas são muitos os casos em que o segredo é revelado a toda a gente através de uma peça jornalística que uma denúncia inspirou.
Dizem os que pretendem menosprezar tal facto que apenas em pouco mais de seis mil casos acontecem fugas do segredo de justiça, quando mais de um milhão de processos está em curso! E eu pasmo perante tal argumento que, por tão estúpido que é, me dispenso de contestar.
Mas voltemos ao fundamental.
Um estudo feito para basear alterações à lei vigente propõe que o jornalista que publica o segredo que não deveria ser do conhecimento público seja considerado cúmplice da “fonte” que lho comunicou e que, com isso, comete, o verdadeiro crime. Mas o jornalista é quem, de facto, materializa o crime que ficará impune se, como é seu direito, o jornalista não revelar as suas fontes e, assim, não disser quem lhe deu a conhecer o que, legalmente, é um crime revelar.
E uma questão fundamental se me coloca: o jornalista comete ou não um crime revelando ao mundo o que a lei diz que não pode ser revelado? Decidam-se os especialistas nestes assuntos.
Além disso, será um direito público conhecer o que a lei entende não o dever ser, em benefício da investigação e por protecção dos direitos de quem esteja a ser investigado? Ou será que a investigação em curso não é prejudicada pela revelação de factos que deveriam ser secretos e os investigados, por ora nem sequer acusados e muito menos condenados, não têm direitos que devam ser protegidos, não fazendo qualquer sentido o segredo de justiça?
Os direitos dos investigados não existem ou são superados pelos dos jornalistas, num regime que a todos reconhece direitos iguais? Parece-me haver aqui algo que não faz sentido.
Ouvi um ex-bastonário da Ordem dos Advogados dizer que se não houver o direito de proteger as fontes não haverá liberdade de imprensa, sem a qual não haverá democracia, sem a qual não haverá Estado de Direito.
Sem falar em Democracia, da qual já diversas vezes aqui disse da sua necessidade de ser adaptada às circunstâncias que, com o tempo, vão mudando, há uma pergunta que, para mim, fica sem resposta: há Estado de Direito quando são cometidos crimes contra a lei do próprio Estado e contra os direitos de pessoas, os quais têm de ficar impunes por conta dos direitos de alguns?
Tenho algumas dúvidas quanto a algumas propostas feitas no documento que propõe soluções nesta matéria que não é fácil. Mas que o jornalista é cúmplice num crime que a lei claramente define, disso não tenho a menor dúvida.
Será solução deixar de ser crime a revelação do segredo de justiça que, deste modo, deixará de o ser? Então, existe o segredo de justiça há tanto tempo para que?


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