É estranho o modo como
certas coisas acontecem neste país de distraídos, coisas que se revelam por
acaso sem que, antes, alguém dê por elas, mesmo aqueles a quem não deveriam
passar despercebidas.
Ao fim de mais de 800 anos
de nacionalidade, as obras para construção de uma barragem no Rio Coa fizeram
descobrir umas pinturas rupestres nas quais, até então, ninguém havia reparado!
Foi como se tivesse saído a sorte grande aos arqueólogos deste país que jamais as
tinham olhado, apesar de bem à vista! E tudo começou a girar à volta dessas
pinturas que passaram a comandar decisões importantes. As obras foram paradas e
a Região pensou que seria o seu momento de progresso, porque romarias de
interessados ali se deslocariam para ver tais maravilhas. Mas, afinal, o alvoroço
não deu em nada, a antiguidade de tais pinturas foi posta em causa e não me consta
que a Região tenha saído do marasmo em que se encontrava! Quem fala a gora das
pinturas rupestres do Coa?
Um outro dia, quando
decorriam as obras para abertura de uma estrada, alguém reparou numa marca que
bem poderia ter sido ali deixada por uma pata de dinossauro! Outro acaso feliz
que fez o Professor Galopim de Carvalho dar pulos de contente e pedir que dali
se afastassem outras ideias que não fossem a sua total preservação. E outro
remédio não houve senão alargar os cordões á bolsa para parar umas obras e
faze-las de outro jeito.
Foi ali na zona Oeste
onde, agora, se descobrem marcas desses enormes animais desparecidos há mais de
sessenta milhões de anos, quase a cada passo que se dá, talvez por obra e graça de um primeiro acaso.
Outras histórias idênticas
poderia contar de coisas que, neste país, parecem cair do céu, já que ninguém se
antecipa a procura-las.
Mas vou de caminho para a
mais recente de todas, as pinturas de Miró, um pintor surrealista catalão que
terminou a sua carreira simplificando sinais gráficos e cores até as reduzir a
pontos e a preto e branco, descobertas após a nacionalização do BPN, atitude
com que o governo de então salvou da ruína muitos oportunistas financeiros e passou para a
responsabilidade do povo os custos de tamanha generosidade.
A entidade encarregada da
liquidação dos bens de tal bomba financeira que encheu os bolsos de muitos enquanto
ajudou a esvaziar os nossos, encontrou diversos objectos de arte, entre os
quais umas dezenas de quadros de Miró que, dentro das suas competências, decidiu
incluir na operação de recuperação financeira a que era de sua conta proceder.
E assim começa uma
confusão estranha e pouco dignificante para o país, com um leilão muito badalado internacionalmente cancelado à última hora pela “batalha” legal que um bem, até aqui totalmente
desconhecido, acaba por gerar, dando de Portugal, uma vez mais, a imagem de uma
terra de loucos!
E parece que nada mais tem
qualquer interesse senão mais este “desmando” de um Governo que outros,
porventura já engendrados, mal podem esperar para lhe ocupar o lugar, enquanto os
enormes e graves problemas deste país continuam por resolver.
Por mim, de bom grado
trocaria esses Miró pelo restauro de tanto património por aí ao abandono e que,
esse sim, faz parte da autêntica cultura portuguesa.
Quando será que, em
Portugal, deixa de andar a carroça à frente dos bois e as coisas acontecem como
é natural que aconteçam?
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