(publicado no NM de Novembro)
Todos nós já algum dia olhámos
para o céu tentando imaginar o que haverá para além do azul imenso que nos
cerca. Para lá olharam, também, os nossos antepassados que não viam mais do que
nós podemos ver hoje num simples olhar. Por isso imaginavam o que estaria para
além do que a sua visão lhes revelava, até que, aos poucos, passaram a
questionar coisas e fenómenos para os quais sentiam necessidade de explicações.
O mistério aguçou a curiosidade que levou à procura de respostas que, aos
poucos, despertaram o espírito científico que conduz ao saber.
Era doutrina oficial a de a Terra
ser o centro de um conjunto limitado de astros, aqueles que conseguíamos ver e
à volta dela se moviam. Seria, até, o centro de tudo o que, para além do que
víssemos, pudesse existir. Era a teoria “geocentrista” que, para além de
corresponder à tendência natural de fazermos de nós próprios o referencial de
tudo, era o que mais facilmente se deduzia das descrições bíblicas de como Deus
criou o Mundo, este planeta que habitamos e onde, para além do Homem e dos
demais seres vivos que, com ele, habitam a Terra, apenas o próprio Deus, seu
criador, os anjos e os arcanjos, bons ou maus, faziam parte do conjunto dos
seres existentes.
De nada mais do que do Reino de
seu Pai, Cristo nos falou para além da Terra. O Salvador que trocou a sua vida por
uma eternidade feliz para todos nós, não nos falou de outras “Terras” onde,
porventura, se passasse algo parecido com o que nesta acontece.
Vão longe os tempos em que, de
modo não pacífico, Copérnico e Galileu transferiram da Terra para o Sol o
centro do Universo, o que, apesar de tudo, não alterou o modo de dizer que o
Sol se põe e volta a nascer, se esconde e reaparece a cada volta em torno do
nosso planeta.
Mas, até esta teoria simplesmente
heliocentrista já pertence ao passado, agora que equipamentos potentes nos deixam
ver mais longe e nos conseguem levar para fora da Terra, ao mesmo tempo que a
Física nos permite interpretar os efeitos de um “Big-Bang” que, é convicção
científica actual, foi a origem de tudo o que vemos e nos rodeia, porque
transformou em matéria o que, até então, era apenas energia.
Situam-se já a muitos milhões de
anos-luz, distâncias difíceis de imaginar, os corpos celestes e os fenómenos mais
longínquos que vamos descobrindo e conhecendo melhor. Hoje sabemos que este
Sol, para nós um gigante que já pensámos ser o centro do Universo e, até, um
deus, não passa de uma estrela em torno da qual nos movemos, uma entre os milhões
de milhões que existem na galáxia a que pertence, para lá da qual milhões de
milhões de outras galáxias, cuja existência se desconhecia ainda pouco antes de
eu nascer, se distribuem por esse espaço infinito e, como no efeito de uma
explosão, por ele se vão espalhando. Ainda me falaram de nebulosas que fariam
parte da nossa galáxia, para além da qual nada existiria, mas que eram, afinal,
outras galáxias que hoje podemos observar melhor.
Hoje já dilatámos os limites
deste Universo que até ao início do Seculo XIX julgávamos não ir além do nosso
sistema solar. O Homem já foi à Lua, já enviou sondas que, para além de muitas
coisas, fotografaram até os misteriosos e deslumbrantes anéis de Saturno,
colocou em Marte um robot explorador que nos vai dar informações pormenorizadas
deste planeta que pode já ter tido as condições da habitabilidade que a Terra
agora tem. Mas tudo isto é muito pouco de tudo quanto exista!
Há muito que perscrutamos o
Espaço procurando sons vindos de um qualquer lugar e que possam conter indícios
ou mensagens de alguma “civilização” que lá se tenha desenvolvido.
Mas não conseguimos ver, em tempo
real, senão o que esteja mais próximo à nossa volta. Para além disso, apenas conseguimos
ver o que aconteceu há já muito, muito tempo, apesar da enorme velocidade com
que a luz viaja desde os confins do Espaço. Quem sabe se aquela estrela
longínqua que um casal de namorados escolheu para ser a “sua” ainda existe?
O conhecimento que já possuímos
sobre a imensidão do Universo e a quantidade quase infinita de planetas que
nele existem, tornam plausível a hipótese de não ser a Terra o único planeta
habitado por seres inteligentes, ainda que com estádios de civilização mais ou
menos avançados do que o nosso, o que, contudo, se não pode ter por garantido.
Mas se tal se verificar, mesmo apenas num caso que seja, quantas questões pode
agitar, quantas dúvidas pode levantar e quantas “verdades” pode destruir!
A descoberta do “bosão de Higgs”,
responsável pela transformação de energia em matéria, foi um passo enorme da
Ciência na procura das nossas origens. Mas não resolveu tudo. Longe disso.
Outros desafios já se colocam na identificação de outras partículas e na explicação
de outros “mistérios” que poderão levar a Física para outra dimensão, num salto
porventura ainda maior do que os que já deu da Fisica Clássica para a
Relativista e para a Quântica, já que toda a matéria da qual nos apercebemos
não passará de cerca de 5% da matéria total do Universo! É imenso o que, apesar
dos meios de que dispomos, não conseguimos ver mas temos a percepção de existir,
como é o caso dos neutrinos estéreis que se crê constituírem a parte da matéria
que não vemos.
Seja o que for que venhamos a
descobrir entre os infinitos mistérios deste Universo a que pertencemos, não
nos trará grande informação sobre a nossa razão de ser enquanto não formos
capazes de responder à pergunta: afinal, porque e para que aconteceu o Big
Bang?
Há uma profunda diferença entre
as atitudes dos nossos antepassados que davam por certo o que imaginavam porque
o não podiam questionar e as dúvidas dos cientistas actuais porque, cada vez
mais, se dão conta da transitoriedade das “verdades” que vão descobrindo. A
cada descoberta outras se seguem que a põem em causa, a modificam ou a
transcendem e quando cremos ter fechado um ciclo logo outro tem início, dando a
sensação de um distanciamento cada vez maior da verdade que desejamos conhecer.
Não pode ser uma simples obra do
acaso o que, seja o que tenha sido, originou tudo isto que sentimos existir e que
procuramos entender, por mais reputado que seja o saber de quem o afirme,
porque o infinito, do Tempo ou do Espaço, não pode começar ali porque não tem
início.
Mas uma conclusão é já possível
retirar sem qualquer receio de nos enganarmos: o Homem, na sua dimensão humana,
não passa de um “infinitamente pequeno” participante neste drama da existência
que ainda não decifrámos o bastante para podermos ter certezas sobre a sua razão
de ser que apenas o desígnio de uma Vontade Superior pode justificar. Apenas em
outra dimensão poderemos encontrar a resposta que procuramos.
Em contraste com tudo isto, não
posso deixar de recordar o deslumbramento ingénuo com que escutei a minha avó
Graça naquela noite de lua cheia já distante de muitas dezenas de anos.
Dizia-me ela que aquela mancha que víamos naquele astro brilhante não era mais
do que um homem que, pelo muito mal que fez, para ali foi exilado e condenado a
caminhar eternamente. E com um saco às costas! Era uma certeza porque já a sua
avó lho contara.
Rui de Carvalho
3 Setembro 2012