(publicado no número de Dezembro do NM)
Já muito tempo passou desde que
nasci. Muito tempo para mim, mas tão pouco na História de que sou parte, a do
Homem que julga existir na Terra para a dominar!
Do nosso passado, do nosso ser e
do nosso destino ainda há muito por saber. Quem são os nossos antepassados
longínquos, como apareceram na Terra, como evoluíram e por onde andaram, são
perguntas ainda sem respostas definitivas porque não vêm de muito longe os
estudos científicos para as tentar descobrir. Começaram, apenas, no final do
Século XIX, um tempo não muito distante daquele em que vim ao mundo.
Depois de uma primeira história
simples que coloca o Homem em África, há pouco mais de cinquenta mil anos, na
Região dos Grandes Lagos Africanos, de onde, subindo o Nilo, se espalhou por
toda a parte, novas descobertas e estudos sugerem uma mais longínqua origem do
que nos diferencia dos outros primatas. O hominídeo mais antigo que a Ciência
já identificou, terá aparecido na Terra há mais de um milhão de anos, talvez
quatro ou um pouco mais, porém sempre a insignificância de um breve instante no
tempo muitíssimo mais longo da vida do nosso Planeta formado há mais de quatro
mil milhões de anos.
Mas estamos ainda longe de
grandes certezas acerca da via ou das vias de evolução até ao Homem Moderno
quando falamos de seres que vão dos australopitecos ao homo habilis, ao
pitecantropus erectus, ao neerdentalense, ao cro-magnon do qual, é agora ideia,
mais directamente descendemos. As hipóteses complicam-se quando os vestígios
encontrados parecem mostrar que alguns deles terão coexistido e convivido,
talvez com consequências que deixarão para mais longos e demorados estudos
outras certezas que, aos poucos, nos vão aproximando da realidade que, creio,
sempre nos escapará, por mais próxima que nos pareça.
Nasci cinquenta mil anos ou mais
de um milhão de anos, quem sabe, depois do meu antepassado mais antigo ter
aparecido na Terra. Apesar disso, devem ter acontecido no curtíssimo espaço de
tempo da vida que já vivi, as mudanças mais extraordinárias das quais a
Humanidade se deu conta ou fez acontecer.
Vi a população da Terra crescer
três vezes mais do que em cinquenta mil anos! Vi evoluir os ronceiros aviões a
hélice até aos velozes jactos em que viajamos; vi os carreiros tornarem-se
auto-estradas onde, em vez de carroças, circulam potentes automóveis; numa
medicina de pouco mais de mesinhas que raramente se opunham com êxito a doenças
perigosas, vi aparecerem os prodigiosos antibióticos que, no entanto, as
bactérias já vão vencendo e vi descobrir a cura para muitas doenças que eram
fatais; vi passar do desconforto de escolas onde o frio era intenso, fazia
bater o queixo e “engatinhava” as mãos a ponto de não conseguirem escrever, às
escolas com climatização, instalações sanitárias e cantina; vi as longas
demoras para conseguir uma simples ligação telefónica interurbana reduzirem-se
a breves segundos, mesmo para conversar com alguém nos antípodas; vi aparecer a
“bomba atómica” que arrasou grandes cidades; vi acontecerem mais guerras do que
todas as que o meu livro de História me deu a conhecer; vi o Homem caminhar na
Lua e mandar foguetões e sondas a lugares e a planetas cada vez mais distantes;
vi a tecnologia acabar com os incómodos ruídos de uma rádio que tornou mais
potente e as emissões regulares de televisão que, de preto e branco, passou a
cores e a alta definição; vi nascer a internet, os computadores, a espantosa
nanotecnologia que permite que caibam numa mão equipamentos que antes
precisariam de um enorme espaço e tantas mais coisas que fariam o enorme
espanto dos meus mais próximos antepassados e deixariam incrédulos, mesmo
julgando-se vítimas de alucinações, outros mais distantes mas que ainda
conheci.
Enfim, vi tanta coisa acontecer e
tão depressa que mais me parece que um filme passou diante dos meus olhos
enquanto nem sequer me afastei desta cadeira onde, sentado, fui desfiando estas
recordações.
E dou comigo a pensar como, a par
de tantos progressos, de tanta coisa excelente que pode fazer melhor a nossa
vida, tantos e tão grandes disparates se fizeram também e tão profundos
estragos foram causados a este único mundo que possuímos para viver, apenas no
curtíssimo intervalo de tempo de uma vida. A par da inteligência de que somos
dotados, o egoísmo e a inveja levam-nos a procedimentos que nos ofuscam o
entendimento da realidade, quase destroem a vida e nos causam problemas
enormes.
Perturba-me esta vertigem das
últimas décadas que tão profundamente fez mudar tanta coisa, do que os
políticos parecem não se dar conta ou não ter força bastante para corrigir as
erradas e inadequadas práticas em que persistem, como na ânsia de viver num dia
o que, antes, se vivia em muitos anos. Um ritmo que a Natureza não acompanha
nem suporta.
Mas ainda conservo a esperança de
que a Humanidade se aperceba, a tempo, de um novo caminho de felicidade que
pode trilhar, esquecendo tudo aquilo que é a causa das preocupações e das
desgraças que ameaçam tornar a vida num profundo caos.
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