Enquanto rapava a barba esta manhã, ouvia na rádio a notícia de que são cada vez mais os idosos vítimas de maus tratos, alguns mesmo em situações de excessiva desumanidade, como os que são postos a viver com animais, a viver nas mesmas condições, na mesma porcaria.
Que estes são, entre outros
também, os efeitos da crise que tornou a vida mais difícil às famílias que vão
deixando de suportar os encargos que eles representam, foi a razão simples que
vi apontar para tal modo de tratar os mais velhos.
Fico logo com vontade de dizer
o que sinto e, por isso, desejaria que, falando, aqueles que eu oiço a dizer
tais coisas, me pudessem escutar também! Mas a rádio apenas tem um sentido e eu
estava do lado do “ouve e cala”! O que não significa que não fique a pensar nos
disparates que oiço, irritado com tanta insensibilidade e desolado pelas
soluções de remedeio propostas que nem paliativos chegam a ser.
Que há cada vez mais
idosos a serem descartados das famílias, é a verdade irrefutável neste programa
que seguiria com uma “antena aberta” que, francamente, não tive paciência para
escutar.
Estou farto de ouvir falar
na crise e nos seus efeitos e sempre me arrepia como tanta gente tem vistas tão
curtas, como tanta gente coloca as causas onde, de facto, não estão! E,
desculpem-me o lugar comum que é dizer que nada mais fazem do que propor soluções
que são como a aspirina que se dá para fazer baixar a febre que uma infecção
qualquer provoca, mas sem tratar esta!
Precisaria, talvez, do
livro que não sou capaz de escrever para dizer tudo, do princípio ao fim, e
explicar a minha ideia de não ser esta crise a causa profunda de tais atitudes e não passa da causa próxima que as faz tomar.
Radicam bem mais fundo as
causas do que se passa, com os idosos maltratados e com muitas coisas mais que vão tornando
a Humanidade desumana e transformando a sociedade que começou por existir para
que os homens se pudessem entreajudar e sobreviver, mas agora existe para que
os mais poderosos explorem e, depois, desprezem os mais fracos.
Mudou profundamente a
mentalidade deste ser que se diz humano mas que, rapidamente, caminha para o
estado selvagem do salve-se quem puder, do que me parece um princípio lapidar
aquela afirmação de um ministro das finanças japonês que afirmou que deveriam os velhos morrer depressa para não
prejudicarem a economia! Afinal, a “economia” tornou-se a razão de ser de
tudo, não o Homem que, tivesse a idade que tivesse, dela deveria beneficiar! É
a perversão das perversões, a prova de que não estará longe o dia em que o
Homem nada mais será do que um bicho sem sentimentos mais do que aqueles que o levam a procurar a moeda para amealhar.
Num jornal, li a
notícia de estarem os trabalhadores que o Qatar contratou fora para construírem
as infra-estruturas do campeonato do mundo que comprou à FIFA, a ser tratados
como párias aos quais nem sequer é pago o valor do seu trabalho! Uma monstruosidade de que a "ficção" de um país "riquíssimo" é capaz!
Lembro-me dos apanhadores
de castanhas em Trás-os-Montes, vindos de países longínquos, porque num país com
17% de desempregados não há mão de obra disponível para tal tarefa!
Lembro-me dos que, em
tempos que há muito já lá vão, nasciam meninos de oiro, poucos, e meninos de
lata, muitos, marcando à nascença o destino de cada um. Ser alguém ou ter de
fazer para alguém o que esse alguém “superior” não faz, era a diferença!
E se todos nos
recusássemos a ser o pau mandado do alguém que nada faz e tudo recolhe, apenas porque tem dinheiro?
Talvez voltássemos a ser
uma Humanidade.
Mas não resulta, porque a
ambição sempre trás consigo a esperança de, um dia, ser alguém e, assim, poder
ter quem faça por nós o que não fazemos.
Só quando chegamos a
idosos nos daremos conta de não ser assim.
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