Há quase três dezenas de anos, publiquei na revista da APESB – Associação Portuguesa para Estudos de Saneamento Básico - um texto sobre o Mar de Aral que um projecto de desenvolvimento económico mal estudado, ou ganancioso se preferirem, estava a reduzir rapidamente. E hoje, o que fora o quarto maior lago natural da Terra, com uma extensão de mais de dois terços de Portugal Continental (66.000 Km2) e mais de 1.000 Km3 de água, não passa de um conjunto de charcos com salinidade elevadíssima.
Nesse trabalho eu chamava a atenção
para os perigos a que os frágeis equilíbrios ecológicos e ambientais estão
sujeitos, em consequência do desprezo a que a ambição do crescimento económico
os vota.
Alimentado por dois grandes rios
principais, o Amu-Darya e o Sir-Darya, o lago era o resultado do equilíbrio,
estabelecido ao longo de milhões de anos, entre os caudais afluentes e a
evaporação intensa naquela região com características semi-desérticas, no Casaquistão e no Uzbequistão..
Era um oásis no meio de extensos
territórios áridos, à volta do qual se estabeleceu uma comunidade humana feliz
que sem ele e as suas riquezas naturais não teria razão de existir.
Rico em diversas variedades de
peixe, algumas únicas, entre as quais o célebre esturjão do Aral do qual se retirava o que era considerado o
melhor caviar, o Mar de Aral tinha uma actividade piscatória intensa e a forte
evaporação através da sua vasta superfície, amenizava o clima que, deste modo,
se tornava mais agradável e permitia o desenvolvimento de florestas de juncos e
de canas, onde viviam grandes comunidades de animais como antílopes, javalis
selvagens, lobos e raposas, além de diversos tipos de aves.
Além de alimentarem o Mar de Aral,
os dois grandes rios eram a origem de água para extensas áreas de cultura que,
com objectivos meramente económicos, os soviéticos quiseram transformar em
campos de produção de algodão que exigiriam que muita mais água fosse desviada,
reduzindo, drasticamente, as afluências ao grande lago.
Assim, em pouco mais de vinte anos,
o quarto maior mar interior na Terra deu origem a enormes campos pode sal,
contaminados e poluídos por enormes quantidades de tóxicos usados nos campos de
algodão, onde jazem dezenas e dezenas de antigos barcos de pesca, e a pequenas extensões
de charcos de reduzida profundidade, praticamente sem vida.
A região tornou-se insalubre, com
variações térmicas diárias que chegam a atingir 40ºC.
Este é um exemplo de como os
excessos que “esta economia” nos leva a praticar podem originar situações graves
e irrecuperáveis.
Por toda a Terra estão em curso
outros fenómenos idênticos, ainda que mais lentos mas igualmente perigosos
pelas repercussões que terão em futuro não muito distante.
Desfeitos, os equilíbrios naturais
são dificilmente recuperáveis ou, mesmo, irrecuperáveis em tempo útil.
A morte do Mar de Aral pode muito
bem ser o modelo acelerado de tantos fenómenos que estão a acontecer.
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